quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

A Ética

Já que eu tenho provas de que ele me deu esse poema e o direito de publicar... Ele será publicado =]

A Ética 
Diógenes Abrantes
"- Ética, o que é você?
-Sou uma velha ranzinza que olho algum pode ver!

-Ética por que diz me o que fazer?
- Porque em um mundo de tolos mais um tolo tu deves ser!

-Ética, mas quem assim te fez?
-A sociedade humana necessita de leis! 

-Mas ética, é necessário tanta rigidez?
- Manufaturo o produto de acordo com o freguês!!!

-Ética o que tenta dizer com tamanha estupidez?
-Digo o que devo e o que deves fazer!

-Ética de fato tu não me agrada 
-Pois vá você ler os contos de fadas

-Ética não vês que agora perdes um amigo? 
-Podes não ser meu amigo, mas sofrerá o castigo!!

-Ética não me prenda, tenho sede de vida, vou me libertar! 
-Assim como os outros revolucionários, aos meus pés morrerá!!!!


Ética, uma velha rígida de infeliz, nasceu com a comunidade e eterna será; já eu rebelde de muitas causas, contra a velha me voltei, imortal não sou, mas com minhas proprias regras, feliz e livre morrerei."

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Chico e eu (parte final)

Não sei se sonhei. Acordei com um susto. Coração quase furava a caixa toráxica. Respiração mal passava pelos pulmões. Motivo? Nenhum. Mais um dia. Acorde e viva, tudo fica bem. Fiquei ouvindo a respiração do Chico. Ele sempre respirara tão alto assim enquanto dormia e eu nunca notara? Que aflição! Observava- o dormir e pensava em todo o tempo em que estivemos juntos, quando o despertador alertou o início de um novo dia. Levantei-me antes que Chico me olhasse. Por algum motivo desconhecido, não queria olhá-lo nos olhos.
No banho, lembrava-me daquele dia há 6 anos e alguns meses: votos de só nos separarmos se a morte interviesse. Não foi mentira. Não se mente quando se acredita no que se diz. Carolina aceita Francisco, para amar-lhe e respeitar-lhe, todos os dias de sua vida? Sim. Aceitei.
Café da manhã silencioso. Silêncio que não incomodava claramente. Silêncio naturalmente calado. Dei-lhe um beijo na testa e saí.
Dia de trabalho cheio de aflição. Um dia que me incomodava, sem que eu soubesse ao certo o que era tão incômodo. Surpreendi-me muitas vezes olhando para o porta-retrato com uma foto minha e do Chico. Ela estava ali há tanto tempo que eu parei de prestar atenção nela. Mas hoje ela teve destaque na minha mesa cheia de documentos e bagunças. Lembrei-me daquele dia. Viagem curta para o interior. Qualquer pessoa que olhasse para a foto sentiria o alto teor de paixão existente nela.
Almoço sem fome. Mesmo restaurante que eu frequentava de segunda a sexta, 11 meses por  ano, há 3 anos. Não lembrei-me disso quando entrei lá. O lugar me incomodou tanto, que quis sair dali. Não o fiz. Entrei e olhei o cardápio - coisa que não fazia há tempos, já que sempre pedia a mesma comida.
"O de sempre, dona Carolina?"
"Não. Hoje eu quero esse aqui. E com queijo extra, ok?" Respondi sem levantar os olhos.
Quando voltava ao escritório, vi uma moeda brilhante no chão. Quem acha um dinheiro, tem sorte o dia inteiro. Caminhei o resto do caminho segurando a moeda com força dentro do casaco. Não sabia bem o que pretendia com aquela atitude, mas agora acho que queria a sorte que o dinheiro achado poderia me trazer. Trabalhei com mais entusiasmo o resto do dia, para que minha mente fosse ocupada demais para pensar em qualquer outra coisa que não fosse de interesse estritamente profissional.
Dentro do carro, no caminho do trabalho até em casa, liguei o rádio com o volume bem alto. Há muito não me divertia tanto cantando junto. Tão simples, mas me trouxe tanta leveza... Toquei a moeda e senti meu rosto sorrir. Entrei em casa e tudo parecia diferente. Tudo bem melhor.
Enquanto preparava o jantar, lágrimas desciam pelo meu rosto. Ainda não sei se foram lágrimas emocionais ou  efeito de cortar as cebolas. Mas em momento algum, tentei impedi-las. Hoje eu era livre. Absolutamente livre. E minhas lágrimas também seriam. Desceriam pelo meu rosto e seguiriam o caminho que quisessem. Exatamente nesse momento, Chico entrou na cozinha e viu minhas lágrimas.
- O que houve?
- Não sei. Acho que o amor
- O amor?
- É. Acho que ele acabou.
Chico me olhava. Buscava entender. Olhava para meu rosto como quem quer penetrar a alma e desvendar seus mistérios mais confusos. Olhava para meu rosto como quem quer perguntar, mas não tem certeza se quer saber as respostas.Olhava como se não soubesse o que.
- O nosso amor, Chico. Acho que ele acabou.
Pela primeira vez naquele dia inteiro, não me incomodou olhar para Chico. Olhei e vi que não era o mesmo. Corrijo-me: ele era o mesmo, quem tinha mudado era eu. A mulher que Chico amava não estava mais ali. Onde estava, então? Há quanto tempo não estava mais ali?
- Chico, é melhor a gente se separar enquanto ainda há respeito.
- É outro homem.
- Não, querido. Não há...
- Então por que você "decidiu" (Ele fez o sinal das aspas com os dedos. Como eu detestava aquilo!) que não me ama mais?
- Eu...
- Ou você nunca me amou? A nossa ideia não era de ser pra sempre? O que mudou?
Chico andava de um lado para ou outro enquanto levantava as mãos e as sacudia, depois colocava-as na cabeça e passava pelo rosto e teve seu rosto invadido por um tom tão vermelho como eu nunca vira antes. Não sabia se ele estava perguntando para mim, para ele mesmo, ou para o Deus que ele nunca acreditara. Foi então que chegamos ao momento crítico da conversa. Chico chorou.
- Eu nunca quis te magoar, mas é melhor ser sincera contigo. Eu não quero te enganar ou atrapalhar nossas vidas. Eu preciso te dizer o que penso e o que sinto. E não dá pra remendar um amor que se acabou. Até porque não foi culpa de nenhum dos dois, e não há explicação pra isso. Enquanto eu te amei, cada dia que eu amei você foi de amor totalmente sincero, profundo e verdadeiro. Mas agora...
Ele apoiou a cabeça na mesa da cozinha e ficou ali por um tempo. Enquanto isso eu o observava e sentia um carinho enorme, uma vontade de pegá-lo no colo e dizer que não precisa chorar, isso passa!, mas não sentia mais vontade de fazer o que sempre fiz, tentando fazer a realidade ser melhor para ele do que sua visão romântica do amor e do casamento. Agora eu via que nunca conseguira e nunca conseguiria fazer com que o mundo real do matrimônio fosse melhor que a perfeição imaginária dele. Toquei seu ombro, mas ele continuou imóvel.
No outro dia, levantei-me da cama sozinha, fiz o café sozinha, tomei café sozinha, tranquei a casa vazia, como se sempre fizesse aquilo daquela forma - sem Chico. Quando cheguei em casa, ele já buscara suas coisas e a casa estava mais vazia. Todos os cômodos, gavetas, armários, estantes, tudo. Chorei, mas disse em voz alta para mim mesma: Você sabe que foi melhor assim, querida.
Encontrei um bilhete de Chico em cima da mesa. O meu amor ainda não acabou. Meu peito doeu apertado por saber que ele estava sofrendo. Além de marido, ele era meu melhor amigo e só eu sei o quanto gostaria que continuasse sendo assim. Mas não seria. Eu nunca mais veria Chico - salvo o dia de assinar os papéis do divórcio. Eu quis ir até ele e abraçá-lo quando o vi na saleta. Mas o que ele fez foi levantar-se e sair ao me ver.


07/08/2010

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Coração de pedra (Parte Final)

    Enfim, chegou o velho. Havia tamanha tensão no ar que ninguém se movia. Todos imaginavam e aguardavam a reação do velho. Ele chegou. Parou. Olhou. Viu. E não viu. Sorriu maliciosamente. Sorriu como quem venceu. Atravessou a rua e sentou-se à mesa vazia do bar. Manteve o sorriso, mas este passou ase desmanchar lentamente e deu lugar a uma expressão séria. Uma expressão tão séria e dura que parecia ser feita de pedra.
    A expressão séria e dura daquele senhor era surpreendente e aquela cena tornava o ato inédito. Ficaram ali parados assistindo como faziam diariamente, mas com a diferença da surpresa que, pela primeira vez, fazia parte da situação.
    O velho ficou imóvel ali até que a plateia não achou mais graça e parou de assistir. Talvez a discussão com a pedra tivesse mais emoção que a figura daquele velho que mais parecia uma estátua de praça quem um ser humano vivente.
    Quando ninguém mais o via, só um cachorro amarelo e emancipado, ele olhou para o último interessado na história e disse:
    "- Eu já tive vida, sabia?"
    Levantou e saiu, deixando o amarelo cachorro sem nada entender.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Coração de pedra (Parte II)

    O velho passava pela rua e cada vez que passava, se encontrava com a pedra. Sim, a pedra ficava na rua e talvez não incomodasse ninguém, já que na rua não passava carro ou outras formas de locomoção moderna. Naquela pacata cidade, andava-se. E exatamente por andar, quem passava por aquela pedra - talvez sem forma para um homem comum, talvez uma obra de arte para uma alma mais artística e poeta, mas que continuava sendo uma pedra - só desviava sem se incomodar. Contudo, não era o que o velho fazia.
    Já disse que ele se encontrava com a pedra porque ele não passava pela pedra somente, como faziam os outros. Ele a encontrava, parava, olhava-a e, ao sentir-se sendo invadido pela raiva devido à presença da pedra, falava com ela sem cortesia palavras grosseiras e indagava por que ela ainda estava ali. Depois de esbravejar, saía resmungando por ver que a pedra não lhe obedecia. Quando ia, brigava. Quando voltava, retomava a discussão. No outro dia, tudo se repetia. A plateia se deliciava com cada apresentação daquele mesmo ato.
    Até que um dia, um expectador, talvez maldoso, talvez bondoso, talvez curioso, talvez engraçadinho, tirou a pedra de lá. Na verdade, nem se sabe se foi alguém mesmo que a tirou de lá, já que nunca descobriu-se um autor; ou se a pedra resolveu sair de lá depois de tantos insultos do velho.O fato é que a pedra tinha sumido e ninguém viu nada.


[continua] 
Parte I

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Coração de pedra (Parte I)

     Era considerado louco, o pobre velho. Que fique bem claro que, ao dizer que o pobre velho magro era considerado louco, não aponto falsidade a quem o considera assim nem concordo com tal afirmação. Não sei o que acontecia com sua saúde mental e sei que todo mundo acha que sabe diagnosticar doenças - sejam elas físicas ou mentais - a partir do que vê na televisão. Sabendo disso e de somente alguns detalhes sobre o acontecido, é que começo a desenrolar a história.
     Já disse que era magro e mal vestido o pobre velho e que não agia como a maioria  age. Mas agia a cada dia como havia agido no dia anterior. A plateia que parava a vida e assistia o magro velho pobre sabia que todo dia ele agia como todos os dias, mas ainda assim paravam a vida e assistiam o velho. Não sei porque parava-se e assistia, mas sem porquê nem explicação era o que acontecia ali.
     O velho passava pela rua. Rua que não tinha carro pra passar. Rua de asfalto cinza feito por operário cuidadoso que nem se lembrava mais daquele asfalto ou que este tinha sido feito por ele. Asfalto cinza que era coberto por camadas antigas e novas de poeira e que faziam o asfalto deixar de ser cinza para ganhar uma cor  sem nome e sem referência possível. Era só isso: o velho, a rua, o asfalto, a poeira e a pedra. A pedra que tão simples é na vida, tão importante é para esse enredo. Se fosse uma novela, seria uma mocinha. Ou uma vilã. Ou um papel de destaque. Mas como não é, ela continua a ser pedra.
     Agora que já está exposto o cenário, posso começar a contar a breve história. Maiores detalhes tornam-se desnecessários. O que nos importa é o velho e sobre ele é que vou tratar.